23/12/2015
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Um dia de Mesa Brasil em Bauru
Mirele Ribeiro, membro da comissão Lixo Menos é Mais, do Sesc Bauru, fez um relato emocionante sobre como foi passar um dia no Mesa; confira:
09/04/2015 – 6h55 – Bauru – SP
Naquela quinta-feira, fiz o caminho rotineiro de 4 anos e meio até o Sesc Bauru. Ao passar o cartão de ponto soltei um bocejo. Sete horas da manhã não é bem o ‘fuso horário’ de quem está acostumada com a jornada da uma da tarde às dez horas da noite.
‘E aí, vamos?’ chamou o colega de trabalho Rodolfo, motorista do Mesa Brasil, que diferente de mim estava bem acordado e disposto. Para ele, era mais um dia de trabalho normal que iniciava; para mim, funcionária da Central de Atendimento, aquela era uma espécie de visita a campo que chamei de ‘um dia de Mesa Brasil’. Mas do que depressa assenti e tratei de seguir ‘os meninos do Mesa’.
Quando chegamos aos caminhões, reparo que não sou a única ‘intrusa’ ali. Ao meu lado, Gisele, nossa auxiliar de odontologia que naquela manhã não estava de branco, também iria acompanhá-los. Gisele entrou em um caminhão, eu entrei em outro, cada uma de nós com uma dupla do Mesa Brasil e, logo que deixamos os portões do Sesc, cada caminhão seguiu rumo a uma direção diferente da cidade. Mas o que afinal duas funcionárias de áreas tão distintas faziam ali ‘pegando uma carona com o Mesa’? Bem, voltemos um pouquinho no tempo…
13/03/2015 – 16h30 – Sala de reuniões do Sesc Bauru
A comissão do programa Lixo Menos é Mais – formada por funcionários de diversos setores da unidade – estava reunida para debater estratégias que auxiliassem a redução de resíduos, para pensar e/ou repensar a destinação dos mesmos e para buscar ações de cunho cultural-educativo em prol do meio ambiente, em um primeiro momento no âmbito interno do Sesc e, posteriormente, estendendo essas ações ao público.
Naquele contexto, recebemos do presidente da comissão um convite. ‘Cada um de vocês vai passar um dia acompanhando o trabalho do Mesa Brasil, desde quando o caminhão sai daqui da unidade para ir captar os alimentos doados até quando retorna pra cá, após redistribuir o que foi coletado para as instituições cadastradas’, propôs Valdir, escriturário do Mesa Brasil, que previu que ao conhecermos como realmente funciona o ciclo de redistribuição que evita desperdícios e alimenta quem precisa feito pelo programa, teríamos uma bagagem maior para debatermos conscientização ambiental e social que tanto queríamos atingir.
A partir dali ficou fixado o calendário para que, um a um, os membros da comissão do Lixo Menos é Mais, tivessem um dia com o Mesa Brasil.
09/04/2015 – 7h20 – Bauru – SP
Com as luvas nas mãos, olhei para a caixa de maçãs… como selecionar? ‘Pensa assim, o que você consumiria na sua casa, levaria para sua família. É o que estará bom para levarmos para as instituições’, me explicou Rodolfo. Respeito: foi a palavra que ecoou na minha mente. A credibilidade que o programa construiu ao longo dos anos está, sem dúvida, baseada no respeito mútuo.
Aquele era somente o primeiro doador do dia, mas o tratamento se repetiu pelo outros que visitamos. Quando chegávamos, os funcionários dos estabelecimentos cumprimentavam cordialmente e indicavam o que tinham reservado para nós, alimentos que já não possuíam mais valor de mercado, mas ainda estavam próprios para consumo, com a convicção de que levaríamos aquela doação para fazer a diferença na mesa de quem estava à espera.
Sobe no caminhão, desce do caminhão. Vai caixa vazia, volta caixa cheia. Sobe, desce… Mercados, panificadora…
09/04/2015 – 11h15 – Bauru – SP
Um caminhão gigante, praticamente fechando a rua, vindo do sul do país como contaram os funcionários do distribuidor de tomates que estavam direcionando o motorista para descarregarem toneladas do produto. Toda aquela movimentação acontecia enquanto levávamos algumas caixas para o nosso caminhão. Dezessete, dezoito, dezenove caixas de tomates… Vinte e cinco, vinte e seis, vinte e sete caixas de avocados… Ou seria o contrário? A verdade é que àquela altura já havíamos percorrido vários estabelecimentos, rodado dentro e fora de Bauru e, confesso, já tinha perdido as contas todas, mas Rodolfo e Hudson continuavam mantendo o controle de tudo o que coletávamos e o caminhão organizado, tudo isso com uma agilidade incrível.
Assim, a manhã passou que nem vi e já estávamos de volta ao Sesc Bauru. Era chegada a hora do intervalo para uns, digo, para nós, e da burocracia para outros, no caso para Valdir e Lisandra (coordenadora do Mesa em Bauru), que a partir daquele momento dariam conta dos recibos, notas e da distribuição adequada para cada instituição que seria visitada no período da tarde diante do arrecadado pelo dois caminhões.
09/04/2015 – 13h – Sesc Bauru
Avocado pra lá, mamão para cá… Com a tabela de distribuição do dia já em mãos, os meninos trocavam itens de um caminhão para o outro. Banana pra cá, pão pra lá… ‘Pronto? Então vamos!’ disse Gisele ao meu lado, visivelmente animada para começarmos a segunda etapa do dia, um reflexo de que, assim como eu, ela já havia sido conquistada pelo trabalho do Mesa Brasil só pelo que viu durante o período da manhã. E lá fomos nós. Mais uma vez, cada caminhão para um lado.
Bauruense, nascida e criada na cidade, me vi chegando a lugares que nem sabia que existiam. Mas as instituições nas quais chegávamos sabiam bem da existência do Mesa Brasil. Incrível, como mais uma vez estava presente o respeito, a simpatia e a cordialidade de ambos os lados.
09/04/2015 – 15h40 – Piratininga – SP
‘Pode ser por aqui…’ indicou a responsável pela instituição que recebia pela primeira vez uma entrega do Mesa Brasil. Enquanto as crianças, em seu intervalo, nos olhavam curiosas e acenavam com as mãozinhas, levamos os mantimentos para a cozinha. ‘Nossa é tudo isso?’ a surpresa estampada no rosto de quem acabava de ser apresentada ao programa. Havia satisfação presente em ter alegrado aquelas pessoas naquele momento, mas existia muito mais por ter o conhecimento de que dali em diante seria permanente.
09/04/2015 – 17h – Sesc Bauru
O dia de trabalho acabou, ou melhor dizendo, a missão diária do Mesa Brasil tinha sido cumprida. Na manhã seguinte, os ‘meninos do Mesa’ estariam novamente nas ruas, fizesse chuva ou sol, realizando o bonito e responsável trabalho de redistribuir. Se antes já admirava a existência do programa, agora me encantava sua essência. E foi então que percebi que aquele dia tinha me impossibilitado de escrever uma matéria em 3ª pessoa, de apenas narrar fatos e citar números ou mesmo de atribuir a esse texto o título ‘Comissão do Lixo Menos é Mais acompanha dia de trabalho do Mesa Brasil’. Pois vivi ali uma grata experiência de imersão que exigiu de mim esse depoimento. Naquela quinta-feira de abril, pude compreender que o Mesa Brasil não é só sobre solidariedade, é mais do que isso, é sobre consciência, responsabilidade e igualdade. É sobre valores como ser humano. Que o mundo viva muitos mais dias como aquele.
Depoimentos
Gisele – odontologia – viveu um dia de Mesa Brasil em 09/04/2015
‘Embora soubesse um pouco sobre o trabalho do Mesa, somente vivenciando, mesmo que por apenas um dia, para saber o quão gratificante é. A dedicação dos funcionários ao efetuarem a coleta dos alimentos é impressionante. Um trabalho muito lindo que é feito através do ato de pensar no próximo, contribui com a diminuição do desperdício de alimentos, que ao chegar nas instituições complementarão as refeições de muitas pessoas, principalmente crianças e adolescentes. Fiquei surpresa com a quantidade de alimentos que são descartados pelas empresas. A lição que fica é de inspiração. O Mesa arrecada onde tem de sobra e leva para onde tem pouco, fazendo com o que seria lixo hoje se torne a refeição de amanhã.’
Guilherme – Administrativo – viveu um dia de Mesa Brasil em 14/05
‘É uma rotina diferente, distante do que estou habituado em fazer nas minhas horas de trabalho. Me sensibilizei pelo programa e pela sua preocupação em proporcionar uma qualidade de vida melhor para crianças, jovens etc. Ressalto também a capacidade e o talento dos funcionários na separação dos alimentos nos estabelecimentos, a grande preocupação com a qualidade destes. Entendo o Mesa Brasil como um conjunto de atividades e ações que supri e complementa de forma solidária o setor alimentar e nutricional de entidades do município e região, combatendo o desperdício.’
Helleni – Secretária – viveu um dia de Mesa Brasil em 14/05
‘Surpreendeu-me a forma como eles trabalham com carinho e atenção, é um trabalho muito certinho, eu não tinha ideia de que é tão cansativo, no último lugar do dia eles carregaram 21 caixas de poncã! Saindo dos lugares eles já vão ligando e repassando aqui pra Unidade qual é o alimento e as quantidades recolhidas, é uma dinâmica muito rápida e trabalho em equipe mesmo. Teve uma instituição infantil que me marcou, pois quando o caminhão foi chegando as crianças já começaram a fazer festa, elas estavam mesmo muito felizes. É um trabalho que realmente funciona. De outro lado é importante que as pessoas entendam como esse programa se desenvolve porque receber o alimento é só uma ponta de um trabalho que é muito mais extenso, que não pode ser visto como uma obrigação do Sesc por parte de quem está ali recebendo essas doações, é necessário consciência e valorizar o que é feito. Acredito que deveria ser ainda mais divulgado por que é um trabalho de se respeitar e tentar imitar em nossa própria rotina.’
Giovana – Administrativo – viveu um dia de Mesa Brasil em 25/06
‘Há todo um cuidado em selecionar o alimento que será consumido por outras pessoas. É perceptível a diferença entre a forma de armazenagem de um mercado e de outro, há aqueles que são exemplo de higiene, mas infelizmente não são todos. E aí, entra o cuidado dos meninos do Mesa em separar tudo certinho e com uma prática de dar inveja. É uma dinâmica muito rápida e que funciona. É algo do qual você fica muito feliz de participar e se pega pensando que poderia existir isso em todos os municípios, pois há muito desperdício por aí. E você repensa valores também. Dessa experiência, eu fiquei muito mais consciente do meu próprio desperdício.’